quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Leitor



Leitor

Espia fundo

Há esperança na palavra

Espera diluída no mundo

Na angústia há breve ânsia

Existe um companheiro?

Reside num solitário sonho

Nele caminha distante

D'onde observa meus incertos passos

Mundo, vasto como o de Carlos

Vejo José, a pedra, Raimundo

Respira Fundo

Há esperança leitor












segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Primeira mandante



Leo estava fechado no quartinho de despejo dos fundos. Mayara teve medo, pois o vínculo de sangue deles estava morto. Ela queria dizer algo que o impedisse o primo de sumir no mundo novamente. Por que algo nele impelia a isto? Leo já não era um rapaz de vinte anos de idade, portanto, sabia da própria vida. Ele não queria ver a moça.
Mayara arriscou-se e apertou a maçaneta com força na esperança que a porta estivesse trancada. Não estava. Leo sabia que a prima viria atrás dele. Quando ela entrou ele estava no fundo do quarto atulhado de ferramentas e caixas. A moça o viu carregando uma arma. O primo andava armado desde quando? Leo fitou Mayara com aqueles olhos verdes: misto de cansaço e tristeza.
-Você quer segurar? Aquelas palavras cravaram na espinha da moça. Estava óbvio que Leo a culpava por tudo. O acontecido, afinal era erro de ambos. Eles apenas esperavam o tempo prescrever. Entretanto, a lealdade construída na infância estava abalada.
-Quer que eu segure uma pistola? Perguntou incrédula com aquela cara de paisagem que irritava o mundo.
-Não entendo o seu espanto, pois já não o fez? Carinha de anjo não segura arma, mas se suja de sangue? Respondeu Leo com asco.
-Segura agora! Imperou o homem com raiva.
-Não vou pedir desculpas! Disse ele ao guardar a arma sem esperar a aproximação dela para cumprir a ordem.
-O que eu te fiz? Aquelas palavras saíram soltas, cínicas chacoalharam no ar e perderam a força. Mayara sabia.
- Não importa o feito, mas sim o que aconteceu depois. Disse ainda com a voz tremula.
- Para você não importa o feito, mas cumprir a pena. Respondeu Leo com um leve sorriso.
Mayara fitou o entorno cheio de caixas. Lembrou-se dos dias que passaram na rede, Leo, ela e as amigas. Eles balançavam a toda a velocidade na varanda da casa do avô. Ele não a enxergava. Leo arriscava-se roubando beijos de suas amigas mais velhas. Complacente Mayara assistia a tudo. Leo enxergava apenas uma criança. Estavam agora ambos, gastos pela vida. Melhor assim. Pensou ela. Era odioso ser aquele anjo assexuado, medroso. Foi de anjo que ele a chamou com desprezo. Repensou, enquanto o olhava.
- Nada mudou. Disse Mayara.
- Mudou sim. Você me acha horrível, não é? Você me acha um bandido desde aquela época. Agora sou o que o Bola seria. Disse Leo.
A menção aquele nome daria o tom da conversa daquele momento em diante. Estavam no quartinho fétido para remoer o passado. Era por isso que falavam baixo, evitaram se encontrar por dez anos. Morto o vínculo ele queria enterrar tudo. Mayara pensou nas palavras a dizer, aproximou-se mais e segurou aquela mão grossa, calejada.
- Não estou achando nada. Estou pensando em muitas coisas não ditas. Respondeu por fim apertando-lhe os dedos dele com sua mão magra e pequena.
- Vejo pela sua mão que pouca coisa a afetou! Não quero mais ver a sua cara de tacho aqui. Vai embora disse empurrando com força a mão de Mayara!
- Some! Disse Leo apontando a porta.
- Não temos nada em comum, saio e acabou. Respondeu Mayara com impaciência.
- Você não me dizia muito, mas eu sempre tentei te proteger. Você é uma ingrata que ajudei. Disse vagamente Leo.
- Eu sei. Depois? Respondeu Mayara de braços cruzados olhando fixamente para o primo.
- Depois daquele dia, o que eu fiz levou a todo o resto. Sempre a polícia atrás de mim e se me pegarem... ziguezagueou Leo.
Mayara adivinhou tudo e doeu-lhe na alma ver o primo ser condenado. Passaria o resto dos dias na cadeia ou seria morto.
- Você sofre demais menina! Pior, por nada. Respondeu Leo.
A conversa foi interrompida abruptamente, quando a mãe de Leo abriu a porta e encontrou os dois primos dentro do quartinho com a pequena janela fechada. Mayara não teve coragem de encarrar a tia e saiu sem dizer nada. A mulher morena e baixinha continuou na porta com um semblante sem graça. Depois que a sobrinha já tinha atravessado o quintal a mãe de Leo falou:
- O que estava acontecendo aqui?
- Nada de importante com essa idiota! Respondeu Leo com afetação.
- Ela queria mexer nas caixas, mas eu não deixei. Afirmou Leo.
- O que Mayara ia fazer com as ferramentas ? Perguntou a mulher desconfiada.
- Sei lá! Disse Leo saindo do cômodo.